"EUA analisam suspeitas contra Brookfield no Brasil
O governo dos Estados Unidos analisa a suspeita de corrupção que envolve o grupo Brookfield em São Paulo (...)
O grupo Brookfield, com sede no Canadá e nos Estados Unidos, tem capital mundial de US$ 150 bilhões.
No Brasil, investe no mercado imobiliário, inclusive shoppings, justamente o setor que está sendo acusado de pagar propina (...)
Nos EUA, quem investiga esses casos é a SEC.
A Brookfield é investigada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público em São Paulo por suspeita de corrupção.
Um de seus principais executivos, Bayard Lima, foi indiciado por suspeita de corrupção ativa e formação de quadrilha, assim como Márcia Saad, ex-executiva do grupo e atual superintendente do shopping Pátio Higienópolis.
Daniela Gonzalez disse à Folha e à Promotoria que a BGE pagou propina para obter benefícios para seus shoppings na capital. Apresentou notas fiscais que justificariam a saída do dinheiro da empresa e e-mails internos em que o assunto é tratado.
Outras seis pessoas ligadas à BGE confirmaram as acusações aos promotores.
O principal beneficiário da propina, diz Daniela, seria Hussain Aref Saab, ex-diretor do Aprov, departamento da prefeitura que aprova plantas de prédios. Aref adquiriu 106 imóveis enquanto esteve no cargo, como a Folha revelou (...)
Também teriam recebido propina o vereador Aurélio Miguel (PR) e outros agentes municipais, como fiscais das subprefeituras.
Tanto Aref como Miguel negam as acusações"
Já explicamos o assunto no ano passado, mas vale relembrar, porque, como a matéria mostra, as empresas atuando no Brasil estão começando a sentir o efeito dessa lei:
Pela Anti-Bribery and Books & Records Provisions of The Foreign Corrupt Practices Act que é a Lei Americana Anti-Corrupção no Exterior (em português aqui), uma empresa americana não pode pagar propina a servidores públicos de outro país. Qualquer país, incluindo o Brasil. Qualquer vantagem ou pagamento indevido que vise obter (ou mesmo evitar a perda de) negócios, ou que dê uma vantagem indevida sobre outros competidores é considerada crime.
Via de regra, um país não julga crimes cometidos em outros países. Adotamos uma postura de 'o meu problema é meu, o seu problema é seu'. Mas a corrupção é um problema tão sistêmico que vários países desenvolvidos começaram, recentemente, a punir as práticas ocorridas em outros países. Afinal, quem garante que o magistrado do país onde o crime ocorreu não seria corrompido também? Pior: o crime pode ter sido cometido lá fora, mas os efeitos do crime são sentidos por acionistas mundo afora. É nessa toada que surgiu a lei americana e, mais recentemente, a inglesa (em inglês, aqui).
Pela lei americana, as penas chegam a US$2 milhões, e quem efetivamente pagou ou autorizou o pagamento, ou de alguma forma estava envolvido pode receber penas de até US$250 mil e 5 anos de prisão. Se houve também adulteração de livros contábeis, as multas sobem para U$25 milhões e US$5 milhões, respectivamente, e a pena de prisão pode chegar a 20 anos (dificilmente uma empresa paga propina sem precisar adulterar seus livros contábeis. Afinal, precisa dizer para onde foi o dinheiro).
E não importa que quem pagou tenha sido a subsidiária da empresa americana: como ela pertence à matriz americana, ela ainda assim está submetida à lei americana.
E ela vai mais além: para que a empresa americana não tente se esquivar sub-contratando outras pessoas para efetuarem os pagamentos, ela também pune os pagamentos feitos por terceiros (marqueteiros, consultores, lobistas etc) em nome da subsidiária ou da matriz.
E ela não é só aplicável às empresas americanas: ela abrange qualquer empresa que tenha 'ações' (ADRs) negociadas em bolsas nos EUA. Uma empresa brasileira com 'ações' (ADRs) negociadas em qualquer bolsa dos EUA está sujeita à lei americana.
E o pagamento ilegal não é só a servidores públicos: inclui candidatos a cargos eletivos e até a partidos políticos.
Assim, um brasileiro que trabalha para uma empresa brasileira que tenha ações na Bolsa de Nova York e que contrate uma empresa de publicidade brasileira que dê um fim de semana em um hotel no Brasil de graça para um deputado brasileiro com a finalidade de convencê-lo a dar uma vantagem econômica à empresa brasileira poderá ser processado por violar a lei norte-americana, ainda que o deputado não tenha conseguido fazer o que a empresa queria.
Óbvio que, como é uma lei americana, ela será aplicada pela Justiça americana, e não pela brasileira. Logo, se foi um brasileiro quem corrompeu, ele será julgado nos EUA. Se ele fez isso no Brasil, ele precisaria ser extraditado para os EUA para ser julgado lá. E como o Brasil não extradita brasileiros, ele estaria protegido, certo?
Nem tanto. Existem três detalhes:
Primeiro, tão logo ele entre no território americano ele poderá ser preso. A mesma coisa acontece se ele estiver em aeronave ou embarcação sob bandeira americana em águas internacionais.
Segundo, quase todos os países desenvolvidos têm tratados de extradição com os EUA. Por exemplo, tão logo ele entre em qualquer um dos 27 países da União Europeia, ele poderá ser preso e extraditado para os EUA. Do ponto de vista jurídico, não há nada que o governo brasileiro possa fazer para prevenir que isso aconteça.
Terceiro: mesmo que o brasileiro que pagou a propina nunca saia do Brasil, a empresa matriz nos EUA ou o escritório nos EUA da empresa brasileira podem, ser processados criminal* e civilmente independente da prisão do brasileiro que de fato pagou a propina.
* Nos EUA é comum as empresas serem processadas criminalmente. No Brasil, isso só é possível em caso de crimes ambientais.